Este Blog se destina a Divulgação Científica, Popularização da Ciência, Geopolítica e esclarecimento político nesse momento que as fake news dominam os noticiários.
sexta-feira, 10 de maio de 2024
O MILAGRE ECONÔMICO BRASILEIRO E A FALÊNCIA DO ESTADO BRASILEIRO. UMA HERANÇA DOS GOVERNOS MILITARES
NEUROCIÊNCIAS: O PERIGO DAS RECEITAS PRONTAS NA APRENDIZAGEM
O discurso das neurociências como uma panaceia para os problemas em sala de aula com seu caráter sedutor acaba fazendo com que a divulgação científica séria fique deixada de lado.
O processo de aprendizagem é complexo, mas o excesso de cobrança por resultados e a pressa em obtê-los fazem com que muitos educadores e educadoras acabem recorrendo a receitas prontas, várias delas supostamente baseadas nas neurociências. Sem conhecimentos prévios na área e com pouco tempo para se aprofundar, profissionais da educação acabam sendo vítimas em potencial para os neuromitos, um antigo tipo de fake news sobre o cérebro.
Entre as ideias erradas sobre o funcionamento cerebral que circulam na educação, uma das mais persistentes é o mito dos diferentes ‘estilos de aprendizagem’ — visual, auditivo, sinestésico. Na realidade, quanto mais estímulos, e mais variados, melhor para todo mundo.
E não faltam cursos rápidos e sem base teórica, além de influenciadores de redes sociais com pouco ou falta de conhecimento. “Vende-se uma ideia de que a aprendizagem é um processo só do cérebro, e dentro dele estará tudo resolvido. Isso é no fundo uma ingenuidade, uma falha de perceber a complexidade do que é aprender”, afirma o neurocientista Fernando Louzada, pesquisador do departamento de fisiologia da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Esse movimento não é recente. Louzada conta que há 20 anos se preocupa com a questão. “Comprei meia dúzia de livros sobre o brain based learning (aprendizagem baseada no cérebro): é só bobagem. Resvala muito na autoajuda”, critica.
Para Louzada, que também é pós-doutor e coordenador do Laboratório de Cronobiologia Humana da UFPR, onde estuda as relações entre sono, aprendizagem e desempenho escolar, não cabe a um estudioso do cérebro ditar como um professor deve ou não ensinar, mesmo quando o docente está usando um conceito ‘errado’. “Conversei uma vez com um professor que disse que passou a separar os alunos segundo esses supostos estilos de aprendizagem e teve resultados ótimos. Que ele continue com a prática então, porque a experiência dele em sala é o que importa — só não dá para ele dizer que é uma prática com base nas neurociências”, alerta.
Neuroficação
Mais do que espalhar bobagens insignificantes, o discurso das neurociências como uma panaceia para os problemas em sala de aula com seu caráter sedutor acaba fazendo com que a divulgação científica séria fique deixada de lado. “A quem interessa essa forma exagerada de divulgar? De um lado, a gente tem uma pressa jornalística, uma vontade de produzir lides bonitos e atraentes. De outro, temos a motivação de aumentar clientes, de vender cursos, livros, cliques em sites, etc.”, pondera o pesquisador da UFPR.
Colocar as neurociências em tudo ou exagerar o seu peso é chamado por Fernando Louzada de neuroficação. Assim, além dos riscos trazidos pelos neuromitos, há outros provocados pela neuroficação, como a negação da própria contribuição das neurociências. Uma das repercussões da ideia do papel exagerado das neurociências é muitos pedagogos acharem que tudo nessa área é um absurdo e rejeitarem as possíveis contribuições. Classificam como um modismo”, acredita ele.
Até mesmo o prefixo ‘neuro’ deveria ser usado com mais moderação. Fernando Louzada cita que é importante os professores conhecerem um pouco sobre nutrição para ensinar aos alunos, mas nem por isso precisam estudar a ‘nutrieducação’.
No momento atual do desenvolvimento científico, acreditar que as neurociências podem dar contribuições certeiras e prescritivas para a educação não passa de uma ilusão. Ligar de forma direta o que acontece com os neurônios de cada um com o que acontece em sala de aula, na interação entre um conjunto de pessoas, é um salto simplesmente grande demais, defende Louzada. “A psicologia cognitiva estabelece uma ponte melhor; deveríamos fazer uma ligação entre as neurociências e a psicologia cognitiva; e outra da psicologia cognitiva para a educação. Talvez seja melhor a gente olhar mais para as evidências da psicologia”, pondera.
Mas se entender o funcionamento do cérebro não pode mostrar o que fazer em sala de aulas, qual seria a diferença para o educador conhecer o que diz a investigação neurocientífica? “Conhecer os mecanismos do cérebro pode não fazer falta, mas se o professor quiser saber porque tem interesse, é fantástico. São conhecimentos que podem ampliar a autonomia do professor, fazê-lo repensar as ferramentas de avaliação, entender aspectos de transtornos ou dislexia e TDAH, ou mesmo do comportamento dos adolescentes”, cita o pesquisador.
Portanto, conhecer o funcionamento cerebral serve para integrar uma nova dimensão na compreensão do processo de ensino e aprendizagem. Louzada se apoia numa metáfora literária, da experiência do escritor José Saramago na ópera de Lisboa, para mostrar o valor das neurociências. Quando Saramago se sentou atrás da coroa que enfeitava o recinto, viu que a coroa só existia pela metade; que a parte de trás era oca, cheia de pó e teias de aranha. “Para conhecer as coisas, é preciso dar volta toda”, escreveu o português. Na educação, a neurociência é mais um passo para completar a volta.
Visão ampla
Adriana Fóz, neuropsicóloga, educadora e diretora da NeuroConecte, concorda que o ‘segredo’ de incluir as neurociências na sala de aula é torná-las fonte de conhecimento e reflexão, mas nunca como uma indicação certa de atividade ou didática. “Se um professor vê um aluno embotado, é interessante ele saber que a emoção vai afetar a qualidade da aprendizagem. Mas o que fazer para mudar aquela situação, isso tem que vir mesmo da experiência daquele professor, da relação que ele mantém com seus alunos. Educar é um processo dialético”, explica.
O papel do professor não se confunde com o do psicólogo ou psiquiatra, mas como o aprender envolve as emoções, ou seja, é preciso ter sensibilidade para as questões emocionais. Da mesma forma, um professor deve estar atento a problemas físicos e deve encaminhar a um oftalmologista uma criança que precisa enxergar bem para ser capaz de aprender a ler e escrever.
Ter o cuidado de entender como os processos cerebrais interferem na aprendizagem, portanto, aproxima o professor da sua função primordial de educar.
“O professor não precisa ser médico, mas se o aluno mostra sinais de uma patologia que dificulta a aprendizagem, o professor precisa identificar e encaminhar. Vale para a saúde física e mental. O professor não é o responsável pela saúde, mas por fatores de proteção”, afirma a diretora do NeuroConecte.
O principal para os professores é entender que o cérebro se modifica, se reorganiza, se renova; fenômeno chamado plasticidade cerebral, pontua a neuropsicóloga Adriana Fóz (Foto: Arquivo pessoal)
Adriana Fóz reconhece que o excesso de preocupação com os caminhos do cérebro pode até atrapalhar na rotina. “A situação de aprendizagem no espaço escolar tem uma especificidade, que se dá naquele momento, e que não deve ter excesso de preocupação de como funciona os processos de aprendizagem”, diz.
Segundo ela, o principal para os professores é entender que o cérebro se modifica, se reorganiza, se renova; fenômeno chamado plasticidade cerebral. “O cérebro é plástico quando se desenvolve na infância, na adolescência e sempre que se aprende. Essa última forma de mudar o cérebro é a vocação da educação”, explica.
Portanto, na prática docente, não é necessário entender o papel da dopamina no sistema de recompensa, defende Adriana. “Há professores que se interessam, mas nenhum precisa saber detalhadamente dos mecanismos. O que é interessante — e o que ajuda no dia a dia — é o professor entender, por exemplo, que o adolescente vai ter menos sensação de prazer, que a emoção do adolescente suprime a capacidade de decisão. Quando briga, quando sofre alguma ameaça, quando se sente péssimo por algum motivo, não vai conseguir pensar na prova”, exemplifica.
Para não precisar se tornar um especialista em cérebro e ainda assim ser capaz de ‘dar a volta toda’ e entender o que se passa no processo de ensino e aprendizagem sob diversos ângulos, o caminho para os professores deve incluir formações de qualidade. “Temos visto uma explosão de cursos, vários sites, páginas no Instagram, e muita porcaria. O processo de formação docente nessa área precisa ser muito cuidadoso, valorizar a experiência que os professores já têm, e ser orientado por profissionais sérios”, aconselha Adriana.
Fonte:
Revista Educação: referência há 28 anos em reportagens jornalísticas e artigos exclusivos para profissionais da educação básica
segunda-feira, 18 de março de 2024
SIM, A QUÍMICA NOS ALIMENTOS.
Química é a ciência que estuda a matéria e suas transformações. Ou seja, quase tudo que acontece no universo é objeto de estudo dessa nobre disciplina pertencente às “ciências naturais”. Porém, ainda é comum usar a palavra química como algo maléfico ou em oposição a natural. Se algo não possui química, não existe.
Nos alimentos, a Química estuda sua
composição, degradação, preservação e a forma como é absorvida por seres vivos,
misturando-se à Biologia, resultando em um campo mais específico do saber: a
Bioquímica. Recentemente foram feitos alertas em relação à forma exagerada como
alimentos têm sido processados em larga escala, os chamados ultraprocessados.
Eles contêm quantidades muito grandes de sais minerais (especialmente na forma
de sais de sódio), gorduras, açúcares e outros aditivos de preservação. Sem contar
que muitos perdem seus valores nutricionais e consistência ao longo das etapas
de processamento.
Assim, um necessário alerta que deve
ser feito, especialmente a articulistas sabichões de jornais da capital
paulista, é que ultraprocessado não é sinônimo de tudo o que tem “adição de
produtos químicos”. Sal e açúcar para alterar ou intensificar o sabor são
produtos químicos, da mesma forma que é produto químico a água que é colocada
para cozinhar arroz e feijão. A distinção deve ser feita de outra maneira, pela
adição de substâncias que não sejam as já constantes em alimentos de forma
geral e, principalmente, pela intensidade e quantidade com que são adicionados.
Alerta e denúncias devem ser feitos, mas a Química deve ser preservada, pois,
afinal de contas, é a ciência que pode resolver a questão da qualidade
alimentar.
Adilson Roberto Gonçalves, pesquisador da Unesp, membro da Academia Campineira de Letras e Artes, da Academia de Letras de Lorena, do Instituto de Estudos Valeparaibanos e do Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Campinas.
Fonte:
quinta-feira, 28 de setembro de 2023
ESCOLAS PODEM USAR VERBAS DE MANUTENÇÃO DO ENSINO EM FEIRAS DE CIÊNCIAS - JÁ ESTÁ NA LDB!
Antes da sanção da norma, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB - Lei 9.394, de 1996) restringia o uso desses recursos como forma de evitar fraudes, só permitindo a destinação para atividades consideradas básicas, como remuneração, aquisição de material didático-escolar, manutenção de instalações e equipamentos.
A autora da lei agora sancionada foi a senadora Professora Dorinha Seabra (União-TO), que não concordava com o fato de órgãos de controle externo questionarem os gastos de escolas com a realização de feiras de ciências, matemática, literatura e cultura. Ela apresentou o projeto (PLC 162/2015 no Senado)quando ainda era deputada.
Aprovado em 2016 pela Comissão de Educação (CE), com emenda da relatora, a então senadora Simone Tebet, a mudança ampliou a definição de atividades complementares voltadas ao aprendizado dos alunos ou à formação continuada dos profissionais da educação. Quando o projeto foi aprovado no Plenário do Senado em 29 de março de 2023, Dorinha defendeu a retomada do texto original, aprovado pela Câmara, o que foi garantido com a rejeição da emenda da CE.
Dorinha disse que o artigo da LDB enumera as despesas de manutenção e desenvolvimento do ensino que podem receber recursos federais. Mas a versão aprovada pela CE, segundo ela, deixava o "texto amplo", sem a definição das atividades que poderiam ser contempladas com a verba, o que poderia trazer riscos para os gestores.
— Esse projeto trata do artigo especifico da LDB do que é permitido utilizar de recursos no desenvolvimento do ensino. Os textos originais têm uma delimitação muito clara, pensando sobretudo numa escola com tempo integral. Ocorre que a emenda apresentada deixava o alcance muito amplo — apontou.
A preocupação de Professora Dorinha convergiu com a de outros senadores, como Flávio Arns (PSB-PR), Izalci Lucas (PSDB-DF) e Teresa leitão (PT-PE).
— A LDB, de forma muito didática, diz o que é manutenção e desenvolvimento de ensino e diz o que não é. Muito gestor de boa-fé ao apresentar os gastos da educação pode fazer alguma coisa que não está explicitamente citado na lei. O projeto dá mais segurança ao gestor ao dizer exatamente do que se trata — reforçou Teresa Leitão.
Fonte:
terça-feira, 19 de setembro de 2023
LEIA A ÍNTEGRA DO DISCURSO DE LULA NA ASSEMBLEIA-GERAL DA ONU
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Leia a íntegra do discurso do presidente Lula na 78ª Assembleia-Geral da ONU, em Nova York, nesta terça-feira (19). Seguindo a tradição, o Brasil abre anualmente uma das mais importantes reuniões de líderes mundiais.
Meus cumprimentos ao Presidente da Assembleia Geral, embaixador Dennis Francis, de Trinidad e Tobago. É uma satisfação ser antecedido pelo secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres. Saúdo cada um dos chefes de Estado e de governo e delegadas e delegados presentes.
Presto minha homenagem ao nosso compatriota Sérgio Vieira de Mello e 21 outros funcionários desta organização, vítimas do brutal atentado em Bagdá, há 20 anos. Desejo igualmente expressar minhas condolências às vítimas do terremoto no Marrocos e das tempestades que atingiram a Líbia.
A exemplo do que ocorreu recentemente no estado do Rio Grande do Sul, no meu país, essas tragédias ceifam vidas e causam perdas irreparáveis. Nossos pensamentos e orações estão com todas as vítimas e seus familiares.
Senhoras e senhores, há vinte anos, ocupei esta tribuna pela primeira vez.
E disse, naquele 23 de setembro de 2003:
"Que minhas primeiras palavras diante deste Parlamento Mundial sejam de confiança na capacidade humana de vencer desafios e evoluir para formas superiores de convivência"
Volto hoje para dizer que mantenho minha inabalável confiança na humanidade.
Naquela época, o mundo ainda não havia se dado conta da gravidade da crise climática.
Hoje, ela bate às nossas portas, destroi nossas casas, nossas cidades, nossos países, mata e impõe perdas e sofrimentos a nossos irmãos, sobretudo os mais pobres.
A fome, tema central da minha fala neste Parlamento Mundial 20 anos atrás, atinge hoje 735 milhões de seres humanos, que vão dormir esta noite sem saber se terão o que comer amanhã.
O mundo está cada vez mais desigual.
Os 10 maiores bilionários possuem mais riqueza que os 40% mais pobres da humanidade.
O destino de cada criança que nasce neste planeta parece traçado ainda no ventre de sua mãe.
A parte do mundo em que vivem seus pais e a classe social à qual pertence sua família irão determinar se essa criança terá ou não oportunidades ao longo da vida.
Se irá fazer todas as refeições ou se terá negado o direito de tomar café da manhã, almoçar e jantar diariamente.
Se terá acesso à saúde, ou se irá sucumbir a doenças que já poderiam ter sido erradicadas.
Se completará os estudos e conseguirá um emprego de qualidade, ou se fará parte da legião de desempregados, subempregados e desalentados que não para de crescer.
É preciso antes de tudo vencer a resignação, que nos faz aceitar tamanha injustiça como fenômeno natural.
Para vencer a desigualdade, falta vontade política daqueles que governam o mundo.
Senhores e senhoras
Se hoje retorno na honrosa condição de presidente do Brasil, é graças à vitória da democracia em meu país.
A democracia garantiu que superássemos o ódio, a desinformação e a opressão.
A esperança, mais uma vez, venceu o medo.
Nossa missão é unir o Brasil e reconstruir um país soberano, justo, sustentável, solidário, generoso e alegre.
O Brasil está se reencontrando consigo mesmo, com nossa região, com o mundo e com o multilateralismo.
Como não me canso de repetir, o Brasil está de volta.
Nosso país está de volta para dar sua devida contribuição ao enfrentamento dos principais desafios globais.
Resgatamos o universalismo da nossa política externa, marcada por diálogo respeitoso com todos.
A comunidade internacional está mergulhada em um turbilhão de crises múltiplas e simultâneas: a pandemia da Covid-19; a crise climática; e a insegurança alimentar e energética ampliadas por crescentes tensões geopolíticas.
O racismo, a intolerância e a xenofobia se alastraram, incentivadas por novas tecnologias criadas supostamente para nos aproximar.
Se tivéssemos que resumir em uma única palavra esses desafios, ela seria desigualdade.
A desigualdade está na raiz desses fenômenos ou atua para agravá-los.
A mais ampla e mais ambiciosa ação coletiva da ONU voltada para o desenvolvimento a Agenda 2030 pode se transformar no seu maior fracasso.
Estamos na metade do período de implementação e ainda distantes das metas definidas.
A maior parte dos objetivos de desenvolvimento sustentável caminha em ritmo lento.
O imperativo moral e político de erradicar a pobreza e acabar com a fome parece estar anestesiado.
Nesses sete anos que nos restam, a redução das desigualdades dentro dos países e entre eles deveria se tornar o objetivo-síntese da Agenda 2030.
Reduzir as desigualdades dentro dos países requer incluir os pobres nos orçamentos nacionais e fazer os ricos pagarem impostos proporcionais ao seu patrimônio.
No Brasil, estamos comprometidos a implementar todos os 17 objetivos de desenvolvimento sustentável, de maneira integrada e indivisível.
Queremos alcançar a igualdade racial na sociedade brasileira por meio de um décimo oitavo objetivo que adotaremos voluntariamente.
Lançamos o plano Brasil sem Fome, que vai reunir uma série de iniciativas para reduzir a pobreza e a insegurança alimentar.
Entre elas, está o Bolsa Família, que se tornou referência mundial em programas de transferência de renda para famílias que mantêm suas crianças vacinadas e na escola.
Inspirados na brasileira Bertha Lutz, pioneira na defesa da igualdade de gênero na Carta da ONU, aprovamos a lei que torna obrigatória a igualdade salarial entre mulheres e homens no exercício da mesma função.
Combateremos o feminicídio e todas as formas de violência contra as mulheres.
Seremos rigorosos na defesa dos direitos de grupos LGBTQI+ e pessoas com deficiência.
Resgatamos a participação social como ferramenta estratégica para a execução de políticas públicas.
Senhor presidente
Agir contra a mudança do clima implica pensar no amanhã e enfrentar desigualdades históricas.
Os países ricos cresceram baseados em um modelo com altas taxas de emissões de gases danosos ao clima.
A emergência climática torna urgente uma correção de rumos e a implementação do que já foi acordado.
Não é por outra razão que falamos em responsabilidades comuns, mas diferenciadas.
São as populações vulneráveis do Sul Global as mais afetadas pelas perdas e danos causados pela mudança do clima.
Os 10% mais ricos da população mundial são responsáveis por quase a metade de todo o carbono lançado na atmosfera.
Nós, países em desenvolvimento, não queremos repetir esse modelo.
No Brasil, já provamos uma vez e vamos provar de novo que um modelo socialmente justo e ambientalmente sustentável é possível.
Estamos na vanguarda da transição energética, e nossa matriz já é uma das mais limpas do mundo.
87% da nossa energia elétrica provem de fontes limpas e renováveis.
A geração de energia solar, eólica, biomassa, etanol e biodiesel cresce a cada ano.
É enorme o potencial de produção de hidrogênio verde.
Com o Plano de Transformação Ecológica, apostaremos na industrialização e infraestrutura sustentáveis.
Retomamos uma robusta e renovada agenda amazônica, com ações de fiscalização e combate a crimes ambientais.
Ao longo dos últimos oito meses, o desmatamento na Amazônia brasileira já foi reduzido em 48%.
O mundo inteiro sempre falou da Amazônia. Agora, a Amazônia está falando por si.
Sediamos, há um mês, a Cúpula de Belém, no coração da Amazônia, e lançamos nova agenda de colaboração entre os países que fazem parte daquele bioma.
Somos 50 milhões de sul-americanos amazônidas, cujo futuro depende da ação decisiva e coordenada dos países que detêm soberania sobre os territórios da região.
Também aprofundamos o diálogo com outros países detentores de florestas tropicais da África e da Ásia.
Queremos chegar à COP 28 em Dubai com uma visão conjunta que reflita, sem qualquer tutela, as prioridades de preservação das bacias Amazônica, do Congo e do Bornéu-Mekong a partir das nossas necessidades.
Sem a mobilização de recursos financeiros e tecnológicos não há como implementar o que decidimos no Acordo de Paris e no Marco Global da Biodiversidade.
A promessa de destinar 100 bilhões de dólares anualmente para os países em desenvolvimento permanece apenas isso, uma promessa.
Hoje esse valor seria insuficiente para uma demanda que já chega à casa dos trilhões de dólares.
Senhor presidente
O princípio sobre o qual se assenta o multilateralismo o da igualdade soberana entre as nações vem sendo corroído.
Nas principais instâncias da governança global, negociações em que todos os países têm voz e voto perderam fôlego.
Quando as instituições reproduzem as desigualdades, elas fazem parte do problema, e não da solução.
No ano passado, o FMI disponibilizou 160 bilhões de dólares em direitos especiais de saque para países europeus, e apenas 34 bilhões para países africanos.
A representação desigual e distorcida na direção do FMI e do Banco Mundial é inaceitável.
Não corrigimos os excessos da desregulação dos mercados e da apologia do Estado mínimo.
As bases de uma nova governança econômica não foram lançadas.
O BRICS surgiu na esteira desse imobilismo, e constitui uma plataforma estratégica para promover a cooperação entre países emergentes.
A ampliação recente do grupo na Cúpula de Joanesburgo fortalece a luta por uma ordem que acomode a pluralidade econômica, geográfica e política do século 21.
Somos uma força que trabalha em prol de um comércio global mais justo num contexto de grave crise do multilateralismo.
O protecionismo dos países ricos ganhou força e a Organização Mundial do Comércio permanece paralisada, em especial o seu sistema de solução de controvérsias.
Ninguém mais se recorda da Rodada do Desenvolvimento de Doha.
Nesse ínterim, o desemprego e a precarização do trabalho minaram a confiança das pessoas em tempos melhores, em especial os jovens.
Os governos precisam romper com a dissonância cada vez maior entre a "voz dos mercados" e a "voz das ruas".
O neoliberalismo agravou a desigualdade econômica e política que hoje assola as democracias.
Seu legado é uma massa de deserdados e excluídos.
Em meio aos seus escombros surgem aventureiros de extrema direita que negam a política e vendem soluções tão fáceis quanto equivocadas.
Muitos sucumbiram à tentação de substituir um neoliberalismo falido por um nacionalismo primitivo, conservador e autoritário.
Repudiamos uma agenda que utiliza os imigrantes como bodes expiatórios, que corrói o Estado de bem-estar e que investe contra os direitos dos trabalhadores.
Precisamos resgatar as melhores tradições humanistas que inspiraram a criação da ONU.
Políticas ativas de inclusão nos planos cultural, educacional e digital são essenciais para a promoção dos valores democráticos e da defesa do Estado de Direito.
É fundamental preservar a liberdade de imprensa.
Um jornalista, como Julian Assange, não pode ser punido por informar a sociedade de maneira transparente e legítima.
Nossa luta é contra a desinformação e os crimes cibernéticos.
Aplicativos e plataformas não devem abolir as leis trabalhistas pelas quais tanto lutamos.
Ao assumir a presidência do G20 em dezembro próximo, não mediremos esforços para colocar no centro da agenda internacional o combate às desigualdades em todas as suas dimensões.
Sob o lema "Construindo um Mundo Justo e um Planeta Sustentável", a presidência brasileira vai articular inclusão social e combate à fome; desenvolvimento sustentável e reforma das instituições de governança global.
Senhor presidente,
Não haverá sustentabilidade nem prosperidade sem paz.
Os conflitos armados são uma afronta à racionalidade humana.
Conhecemos os horrores e os sofrimentos produzidos por todas as guerras.
A promoção de uma cultura de paz é um dever de todos nós. Construí-la requer persistência e vigilância.
É perturbador ver que persistem antigas disputas não resolvidas e que surgem ou ganham vigor novas ameaças.
Bem o demonstra a dificuldade de garantir a criação de um Estado para o povo palestino.
A este caso se somam a persistência da crise humanitária no Haiti, o conflito no Iêmen, as ameaças à unidade nacional da Líbia e as rupturas institucionais em Burkina Faso, Gabão, Guiné-Conacri, Mali, Níger e Sudão.
Na Guatemala, há o risco de um golpe, que impediria a posse do vencedor de eleições democráticas.
A guerra da Ucrânia escancara nossa incapacidade coletiva de fazer prevalecer os propósitos e princípios da Carta da ONU.
Não subestimamos as dificuldades para alcançar a paz.
Mas nenhuma solução será duradoura se não for baseada no diálogo.
Tenho reiterado que é preciso trabalhar para criar espaço para negociações.
Investe-se muito em armamentos e pouco em desenvolvimento.
No ano passado os gastos militares somaram mais de 2 trilhões de dólares.
As despesas com armas nucleares chegaram a 83 bilhões de dólares, valor vinte vezes superior ao orçamento regular da ONU.
Estabilidade e segurança não serão alcançadas onde há exclusão social e desigualdade.
A ONU nasceu para ser a casa do entendimento e do diálogo.
A comunidade internacional precisa escolher:
De um lado, está a ampliação dos conflitos, o aprofundamento das desigualdades e a erosão do Estado de Direito.
De outro, a renovação das instituições multilaterais dedicadas à promoção da paz.
As sanções unilaterais causam grande prejuízos à população dos países afetados.
Além de não alcançarem seus alegados objetivos, dificultam os processos de mediação, prevenção e resolução pacífica de conflitos.
O Brasil seguirá denunciando medidas tomadas sem amparo na Carta da ONU, como o embargo econômico e financeiro imposto a Cuba e a tentativa de classificar esse país como Estado patrocinador de terrorismo.
Continuaremos críticos a toda tentativa de dividir o mundo em zonas de influência e de reeditar a Guerra Fria.
O Conselho de Segurança da ONU vem perdendo progressivamente sua credibilidade.
Essa fragilidade decorre em particular da ação de seus membros permanentes, que travam guerras não autorizadas em busca de expansão territorial ou de mudança de regime.
Sua paralisia é a prova mais eloquente da necessidade e urgência de reformá-lo, conferindo-lhe maior representatividade e eficácia.
Senhoras e senhores
A desigualdade precisa inspirar indignação.
Indignação com a fome, a pobreza, a guerra, o desrespeito ao ser humano.
Somente movidos pela força da indignação poderemos agir com vontade e determinação para vencer a desigualdade e transformar efetivamente o mundo a nosso redor.
A ONU precisa cumprir seu papel de construtora de um mundo mais justo, solidário e fraterno.
Mas só o fará se seus membros tiverem a coragem de proclamar sua indignação com a desigualdade e trabalhar incansavelmente para superá-la.
Muito obrigado.
Fonte: