sábado, 29 de abril de 2023

QUEM VAI OCUPAR O CENTRO GEOPOLÍTICO DE PODER? DO NORTE GLOBAL AO SUL GLOBAL!



MUNDO POLICÊNTRICO

Em meio a tensões geopolíticas, China e Estados Unidos vêm travando uma acirrada disputa pelo centro de poder global. Especialistas apontam que um mundo dividido em dois blocos antagônicos é o oposto daquilo que países do Sul Global, como o Brasil, desejam.

Em artigo recente na revista Foreign Affairs, o atual chanceler federal alemão Olaf Scholz definiu o cenário geopolítico mundial em 2022 com a palavra Zeitenwende, ou seja, “guinada histórica”. De acordo com o premiê, a fase “extraordinária” da globalização, durante a qual a América do Norte e a Europa tiveram crescimento estável, altas taxas de emprego e inflação baixa, após a derrocada do bloco soviético, chegou ao fim. Diante da ascensão da China como importante player global atual, Scholz enfatiza a importância da construção de um mundo multipolar, com vários centros de poder, a fim de evitar uma nova Guerra Fria – desta vez entre Washington e Pequim.

De fato, parece ser consenso entre analistas internacionais que os Estados Unidos não estão mais sozinhos no centro da geopolítica. A hegemonia econômica, militar e política estadunidense é cada vez mais ameaçada pela China, que, aliada à Rússia, vem criando uma contraforça em relação ao Ocidente. De acordo com a projeção mais recente do grupo financeiro Goldman Sachs, embora a economia chinesa tenha desacelerado nos últimos anos e a população esteja em queda, o PIB do país pode superar o dos Estados Unidos por volta de 2035.

Distribuição mais igualitária de poder

Um mundo dividido em dois blocos antagônicos, porém, serve menos aos interesses de países emergentes do chamado Sul Global, como o Brasil. Na última cúpula da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), realizada em janeiro último, em Buenos Aires, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se comprometeu a reforçar o multilateralismo e a “construção coletiva da multipolaridade”.  

“Essa multipolaridade remete a uma concepção de distribuição de poder igual e o papel do Brasil é lutar por ela a partir da sua política externa”, afirma Karine de Souza Silva, professora de Relações Internacionais e Direito na Universidade Federal de Santa Catarina. “Em termos militares e econômicos, ainda existe uma bipolaridade clara entre os Estados Unidos e a China. Um mundo policêntrico ou multipolar é uma vontade intelectual e diplomática, mas, enquanto existirem trocas desiguais, ele não pode se consolidar”, completa Silva.

Ponte entre Norte e Sul Global

Luciana Ballestrin, cientista política da Universidade Federal de Pelotas, acredita que, com a crescente polarização de forças na geopolítica, o Brasil não deverá tomar partido de nenhum dos dois rivais, mas fazer uma diplomacia pragmática e estratégica, mantendo a equidistância. E se China e Estados Unidos são hoje os dois grandes centros do poder, ambos dependem, porém, de outros “centros” de influência para exercer sua liderança, como ressalta a economista Karin Costa Vazquez, pesquisadora da Universidade Fudan, em Xangai.

“A Índia é uma economia que vem crescendo muito rápido e exercendo um papel estratégico na geopolítica mundial como um pivô no Indo-Pacífico muito importante. Temos a Asean no Sudeste Ásiatico e, na África, os países em torno da União Africana. A América Latina é outro polo que, apesar da instabilidade política, exerce papel importante no tabuleiro, tanto para os Estados Unidos quanto para a China”, analisa Vazquez. Para a economista, o Brasil deve não apenas manter a neutralidade em relação aos dois centros antagônicos, mas criar pontes entre os países emergentes do Sul Global e os desenvolvidos do Norte Global, projetando seu soft power no plano internacional. Para isso, é necessário, em primeiro lugar, retomar a posição do país na América Latina.

Retorno ao palco geopolítico

A volta do Brasil à Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), à União de Nações Sul-Americanas (Unasul) e à Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA) são os primeiros passos nessa direção. Segundo Vazquez, o país tem condições materiais concretas para exercer essa liderança: “Com o Brasil sediando os Brics e possivelmente a COP-30 em 2025, estaremos presidindo plataformas importantes de coordenação político-econômica, e a proposição brasileira, com uma agenda construtiva nesse momento tão delicado, pode fazer grande diferença”.

Para Silva, no entanto, reconstruir pontes entre os países centrais e periféricos em um cenário adverso – marcado por uma crise de governança global, pela guerra na Europa e pela instabilidade econômica agravada pela pandemia – é um desafio. “Os últimos quatro anos foram muito ruins para a política externa, porque o Brasil estava em uma situação de insularidade. Agora o país vai voltar a dialogar com as potências e com as nações com as quais tinha bloqueado os canais de interlocução, se utilizando de uma estratégia multilateral e de diversificação de parceiros, como os Estados Unidos, a Europa, a China, os países periféricos”, afirma Silva. “O Brasil tem condições de opinar como protagonista sobre temas internacionais que são desafios comuns, como paz, segurança, mudanças climáticas, comércio, intercâmbio de tecnologias”, completa.

Construção retórica

Na batalha de poder que se configura entre os diversos centros, Vazquez enxerga “a dualidade entre autocracia e democracia” como uma construção retórica. “A disputa entre os Estados Unidos e a China é por alta tecnologia, inteligência artificial, biomedicina, aviação, robótica, semicondutores. É isso que está em jogo”, afirma. “Entre as democracias no Ocidente, de um lado, e a China e a Rússia, de outro, existem muitas nuances. A própria Índia, que é um aliado pivô dos Estados Unidos no tabuleiro internacional, vem tendo sua democracia muito questionada sob o atual governo do primeiro-ministro Narendra Modi”, pontua.

Neste contexto, a ascensão, no interior dos países ocidentais, de grupos antidemocráticos, é também uma preocupação internacional. “Dentro das próprias democracias existem grupos autoritários de extrema direita, que é supremacista branca. São movimentos anti-imigração, racistas, classistas, homofóbicos e heteropatriarcais. O Brasil, durante a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (2018-2022), utilizou a política externa para se alinhar a grupos ultraconservadores internacionais. A gente não vai conseguir resolver os grandes problemas se não tocar nessa ferida do supremacismo branco”, afirma Silva.

Em cenário geopolítico de tal forma conturbado e multicêntrico, a figura do presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva pode ajudar a desarticular tensões e fazer mediações a nível global, acredita Ballestrin. “Neste momento de crise democrática, precisamos de lideranças comprometidas com uma noção de democracia que seja mais crítica à globalização neoliberal predatória. Existe a preocupação com as desigualdades econômicas, com compensações e reparações. É algo muito importante quando não há mais projetos políticos alternativos estruturais ao capitalismo neoliberal globalizado”, resume a cientista política.

Fonte: 

Goethe-Institut Brasil

sábado, 22 de abril de 2023

ESTUDO MOSTRA QUE AUTORES DA ÁSIA, DE PAÍSES POBRES E QUE NÃO TÊM O INGLÊS COMO LÍNGUA OFICIAL SOFREM DESVANTAGEM NA REVISÃO POR PARES

Embora haja maneiras de mitigar vieses, poucas revistas fazem algo nesse sentido, dizem biólogos da Universidade Estadual de Michigan (MSU), nos Estados Unidos, autores do estudo publicado em março na revista Nature Ecology & Evolution

Pesquisadores do campo das ciências biológicas que trabalham em países de baixa e média renda e não têm o inglês como língua nativa enfrentam mais dificuldades para publicar seus trabalhos em revistas científicas internacionais. Em geral, as chances de eles receberem pareceres favoráveis no processo de revisão por pares são inferiores às de pesquisadores dos principais centros produtores de ciência.

A conclusão consta de um levantamento feito por biólogos da Universidade Estadual de Michigan (MSU), nos Estados Unidos, publicado em março na revista Nature Ecology & Evolution.

O grupo, liderado pela ecóloga Courtney Davis, analisou mais de 312.740 manuscritos na área de ciências biológicas publicados em 640 periódicos, muitos deles de impacto elevado, como Science, Proceedings of the National Academy of Sciences e os da coleção Nature.

O objetivo era verificar se a origem dos autores principais dos artigos teria alguma influência na decisão dos pareceristas em aceitar seus papers para publicação. Observou-se, então, que autores vinculados a instituições da Ásia, de países pobres e que não têm o inglês como língua oficial tendem a receber mais pareceres negativos. “Em comparação com autores com afiliações localizadas na Europa, América do Norte e Oceania, os da Ásia apresentaram as disparidades mais consistentes, mas os da América Latina e da África também tiveram resultados de revisão piores”, informa o artigo.

O gênero presumido dos autores também influencia em avaliações, com desvantagem para as mulheres. Foi rastreada, ainda, a localização dos periódicos e de seus editores-chefes. Descobriu-se que eles se concentravam em poucos lugares – notadamente Estados Unidos, Canadá e países da Europa Ocidental –, justamente os que têm melhores resultados na revisão por pares.

Embora haja maneiras de mitigar esse tipo de viés, poucas revistas fazem algo nesse sentido. Segundo o grupo da MSU, menos de 16% dos periódicos em ecologia e biologia evolutiva usam um modelo de revisão duplo-cego, no qual nem os autores nem os revisores são informados sobre os nomes uns dos outros. Uma recomendação dos autores é ampliar a diversidade dos conselhos editoriais e os grupos de revisores, incluindo mais cientistas de grupos tradicionalmente excluídos.

Jornal da Ciência

REVISTA FAPESP

GOVERNO ANUNCIA R$ 2,4 BILHÕES PARA RECOMPOR ORÇAMENTO DE UNIVERSIDADES E INSTITUTOS FEDERAIS

Foto: Ricardo Stuckert / PR


Recursos são voltados para fortalecer finanças e dar sequência a obras e ações estruturantes, como programas de residência médica e bolsas de permanência

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou, nesta quarta-feira, 19/4, um repasse de R$ 2,44 bilhões para o fortalecimento do ensino superior e profissional e tecnológico no Brasil. O evento ocorreu no Palácio do Planalto, em Brasília, com a presença de reitores, parlamentares, ministros, entidades representativas da educação e alunos de institutos federais. A recomposição reverte a curva descendente do orçamento das universidades e institutos federais dos últimos anos.

O que estamos anunciando hoje é uma semente que estamos colocando na educação. Espere que ela vai crescer, florescer e dar os frutos que nosso país tanto precisa”

Luiz Inácio Lula da Silva, presidente da República

Desse total anunciado, 70% (R$ 1,7 bilhão) serão voltados para a recomposição direta das finanças (aproximadamente R$ 1,32 bilhão para universidades e R$ 388 milhões para institutos). Os outros R$ 730 milhões serão aplicados para atender obras e ações que foram deixadas sem cobertura pela gestão anterior, a exemplo da residência médica e multiprofissional e bolsas de permanência.

“O que estamos anunciando hoje é uma semente que estamos colocando na educação. Espere que ela vai crescer, florescer e dar os frutos que nosso país tanto precisa”, afirmou o presidente Lula. Ele ressaltou a disposição da atual gestão para o diálogo transparente com todas as instâncias da sociedade para a tomada de decisões. Lembrou que ontem mesmo, na terça, recebeu governadores, prefeitos e ministros para discutir soluções para a violência nas escolas. E ressaltou que a educação é o caminho claro e necessário para fazer o país atingir outros patamares de qualidade e desenvolvimento.

“A universidade não é só para fazer teses sobre os problemas sociais, é para ajudar a resolver os problemas sociais. Como a gente vai criar os empregos novos, no mercado de trabalho novo, sem a inteligência das universidades? É preciso que a gente conte efetivamente com essa contribuição. Mais do que teses, transformar em coisas práticas o que a gente conseguiu fazer em teses, para esse país dar um salto de qualidade definitivamente”, afirmou o presidente.

Lula citou a viagem que fez à China na semana passada como exemplo de uma economia que deu um salto nos últimos 30 anos a partir de um forte investimento em educação, ciência e tecnologia. “O que a China fez nos últimos anos é de causar inveja a qualquer governante do mundo. Por que o Brasil, do tamanho que é, com a riqueza que tem, continua pobre? Por que para dar um aumento de 18 reais no salário mínimo é um sacrifício enorme? Temos de dar um jeito nisso. Não enquanto governo, mas enquanto sociedade. Que sociedade queremos ser, em que momento da história vamos nos tornar um país rico em conhecimento, em qualidade de trabalho, em educação?” questionou.

Segundo o presidente, a receita adotada pela atual gestão é acreditar num Estado indutor de investimentos e que se paute pelas premissas da credibilidade, da estabilidade jurídica e social e da previsibilidade. “Não existe milagre em economia. Você não distribui o que não produz. Por isso que é importante a economia crescer, e ela vai crescer quando tiver investimento. Para ter investimento, tem que ter consumo. Para o empresário vender um produto, ele precisa saber que a sociedade quer comprar, e para isso o governo tem que contribuir. O Estado tem de ser indutor”, disse.

RETOMADA

O anúncio desta quarta-feira é parte de uma série de iniciativas do Governo Federal para voltar a valorizar o ensino superior, que passou por uma série de dificuldades na gestão anterior, sobretudo em 2022, quando ficou sem orçamento para despesas básicas mínimas, com dois cortes e três contingenciamentos ao longo do período. “É uma recomposição discutida por secretários e secretárias, por parlamentares, pelas entidades da educação. Parte é para recomposição do orçamento discricionário, parte para obras e ações importantes para estudantes e professores”, afirmou o ministro da Educação, Camilo Santana.

Em janeiro de 2023, o presidente Lula restabeleceu o diálogo com o setor recebendo reitores de todo o país no Palácio do Planalto. Em fevereiro, anunciou o reajuste de até 200% em bolsas de graduação, pós-graduação, de iniciação científica e na Bolsa Permanência. Pouco depois, foi anunciada a recomposição de R$ 1,5 bilhão no Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), que garante a qualidade das merendas escolares em instituições públicas de ensino.

Segundo o ministro, as ações são retrato de um governo que historicamente valoriza o tema. Ele lembrou que no período em que Lula e Dilma Rousseff foram presidentes, foram criados 422 dos 679 campi de institutos federais do país e 181 dos 314 campi de universidades federais. “Esse é o maior patrimônio que um país pode ter. Demonstrar que esse governo prioriza educação pública e de qualidade para o povo brasileiro”, disse.

As universidades têm ambições. Querem fazer parte de um projeto de futuro, Para isso, enquanto patrimônio do povo brasileiro, precisam dessa valorização, que haja financiamento contínuo e consistente como em qualquer lugar civilizado no mundo”

Ricardo Marcelo Fonseca, presidente da Andifes

ALÍVIO – A recomposição orçamentária levou alívio a gestores de institutos e universidades, que viveram nos últimos seis anos cortes contínuos de recursos e, consequentemente, dificuldade de funcionamento.

“O orçamento enviado ano passado era inviável. Esse anúncio vai nos fazer retornar a patamares anteriores à pandemia. Vai dar o respiro fundamental para sobrevivência das universidades em 2023”, disse Ricardo Marcelo Fonseca, reitor da Universidade Federal do Paraná e presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais do Ensino Superior (Andifes).

“As universidades têm ambições. Querem fazer parte de um projeto de futuro, Para isso, enquanto patrimônio do povo brasileiro, precisam dessa valorização, que haja financiamento contínuo e consistente como em qualquer lugar civilizado no mundo”, completou, destacando também o potencial inclusivo das universidades federais e o fato de mais de 95% da formação em Ciência e Tecnologia ser feita por instituições públicas.

Os institutos federais também enfrentaram dificuldades, segundo Maria Leopoldina Veras, presidente do Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Cientifica e Tecnológica (Conif). “Os bloqueios impediram que atingíssemos o nosso objetivo de formar completamente os estudantes. Com a recomposição, vamos conseguir ampliar a assistência estudantil, fator crucial que impacta diretamente na alimentação e no transporte do aluno”.

As jovens Isabelly Fábia da Silva Cunha e Ludmila de Souza Félix, ambas de 16 anos, viveram as dificuldades decorrentes do corte de recursos. Estudantes do curso de Agropecuária do Instituto Federal de Brasília, elas viram a alimentação perder qualidade e ficar menor. Alunas do curso integral, no ano passado, tinham almoço, mas faltavam os lanches das tardes e manhãs. Houve, ainda, outras limitações, como falta de recursos para manutenção ou contratação de transporte que viabilizasse um passeio técnico comum na escola. Ludmila, que tem bolsa permanência, chegou a ficar três meses sem receber.

AVANÇAR

Presidente da União Nacional dos Estudantes, Bruna Brelaz definiu a recomposição orçamentária como um grande suspiro de novos tempos para universidades e institutos federais, após um período em que a universidade e os estudantes universitários eram tratados, segundo ela, como adversários, como ‘centros de balbúrdia’. “Esperamos que essa recomposição seja um dos passos para garantir que os filhos e filhas dos mais pobres permaneçam nas universidades com qualidade. Agora entramos aqui pela porta da frente. Temos certeza de que vamos avançar”.

Jornal da Ciência

Planalto

NÃO É SÓ O BRASIL: A DEMOCRACIA ESTÁ SENDO CORROÍDA EM TODO O MUNDO

         A group of pro-Bolsonaro rioters attack government institutions in Brasília, on January 8, 2023. MARCELO CAMARGO (EFE)

“Os demagogos – aproveitando-se da agitação social e da polarização – estão corroendo a força das democracias. Apesar disso, as instituições continuam a mostrar resiliência face ao autoritarismo”, comenta o correspondente de assuntos internacionais do jornal El País

O ataque de 8 de janeiro à capital do Brasil – perpetrado por uma multidão de apoiadores do ex-presidente de extrema-direita Jair Bolsonaro – é mais um lembrete sobre a crescente ameaça global à democracia.

Somente nas últimas semanas, vários sinais de desgaste do tecido democrático se materializaram. A violência aumentou no sul do Peru, após o impeachment do ex-presidente Pedro Castillo, que tentou fechar o Congresso de seu país antes de ser preso. Na Tunísia – outrora uma grande esperança democrática no mundo árabe – uma eleição foi realizada pouco antes do Natal, que teve uma participação desanimadora de apenas 11%, ameaçando a credibilidade do processo. Enquanto isso, o presidente da Turquia, Erdoğan, está usando o sistema judicial do país para perseguir potenciais oponentes – incluindo liberais, esquerdistas e centristas – que têm uma boa chance de derrotá-lo em 2023, caso consigam ficar fora da prisão.

Esses desenvolvimentos são apenas os últimos em um fenômeno de deterioração democrática – algo sobre o qual estudiosos e grupos da sociedade civil vêm alertando há algum tempo. No entanto, muitas democracias também mostraram sinais notáveis ​​de resiliência. Nos casos do ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump e de Bolsonaro, ambos foram derrotados em processos democráticos, enquanto os serviços de segurança e os tribunais conseguiram conter a violência de seus partidários mais radicalizados.

Especialistas ainda alertam sobre ser complacente. A Freedom House – uma organização sediada em DC financiada pelo governo dos EUA – registrou um declínio na liberdade em todo o mundo nos últimos 16 anos. Mais países experimentaram retrocessos democráticos, em vez de fazer progressos. Em 2021, 60 países democráticos foram classificados como em regressão, enquanto 25 foram considerados em progresso.

Da mesma forma, o Instituto para a Democracia e Assistência Eleitoral (IDEA) – organização intergovernamental sediada na Suécia e financiada por 34 países – detecta que, entre os cem países classificados como democracias, houve um aumento acentuado no número de nações que sofrem de um cerceamento das normas democráticas. Dos 104 rastreados pelo IDEA, 48 estavam regredindo, com apenas 14 melhorando. As demais permaneceram estagnadas. Enquanto isso, um estudo da Universidade de Cambridge aponta para um distanciamento especialmente alto da política sendo observado entre as gerações mais jovens.

Quais são as causas desse fenômeno? Obviamente, cada país tem suas especificidades, mas existem alguns denominadores comuns.

“Há definitivamente uma crise das democracias”, afirma Paolo Gerbaudo, sociólogo do King’s College de Londres. “Na minha opinião, uma das principais causas é a forma como a globalização tornou o Estado nacional democrático – o quadro fundamental no qual se desenvolveu a democracia que conhecemos – numa estrutura extremamente frágil. Os efeitos da globalização impedem [os governos democráticos] de fazer as coisas, cumprir as promessas, isso causa decepção, um sentimento de traição”.

Kevin Casas-Zamora, secretário-geral do IDEA e ex-vice-presidente da Costa Rica, aponta três razões principais. Em primeiro lugar, “a desintegração interna, com o surgimento da polarização extrema”. Depois, “a perda de confiança nas instituições democráticas como instrumentos capazes de dar soluções sólidas aos problemas do povo. Nessa área, um elemento particularmente tóxico é a corrupção, que gera um alto grau de distanciamento”. No Brasil, uma das principais razões para a ascensão de Bolsonaro ao poder em 2018 foi a enorme quantidade de corrupção que manchou a administração do Partido dos Trabalhadores de Lula, que esteve no poder de 2003 a 2016.

Por fim, Casas-Zamora observa “o contexto internacional, onde se paga um preço mais baixo por seguir um caminho autoritário . Existem modelos – como o chinês – que combinam uma repressão horrível com um alto grau de eficiência econômica”.

Gerardo Berthin, vice-presidente de programas internacionais da Freedom House, também destaca que a desigualdade econômica é um poderoso fator por trás da frustração. As mudanças demográfico-sociais são percebidas por alguns grupos como realidades ameaçadoras, que os levam a buscar alternativas políticas radicais.

O crescente descontentamento com as condições de vida é aproveitado por líderes populistas, que exacerbam a polarização, cultivam um clima de animosidade e desmantelam as instituições democráticas, de modo a reduzir os freios e contrapesos ao seu poder.

Há amplos setores das sociedades democráticas para os quais se quebrou a ideia de que o futuro será melhor. Isso gera uma rejeição sistêmica ao status quo, abrindo caminhos perigosos para expressar frustração.

Yasha Mounk e Jordan Kyle publicaram um extenso estudo sobre a ascensão do populismo em 2018. Os dois cientistas políticos construíram um banco de dados, compilando uma lista de governos definidos como “populistas” comparando mais de 50 periódicos acadêmicos. Eles identificaram 46 líderes populistas ou partidos políticos no poder em 33 países entre 1990 e 2018.

O estudo produziu vários resultados perturbadores. Em primeiro lugar, esse tipo de governo permanece no poder por mais tempo – em média – do que os não populistas; apenas uma minoria desses líderes deixa o poder por meio de um processo normal de transição. Cerca de 50% reformam a constituição para reduzir freios e contrapesos, eliminar limites de mandatos ou empilhar o judiciário com partidários.

Constatou-se também que há uma proporção semelhante de líderes populistas de direita e de esquerda, causando um declínio significativo na democracia. Cinco dos 13 casos à direita; cinco dos 13 casos à esquerda. Claramente, o desdém pela democracia não se limita a um lado do espectro político.

No entanto, no longo prazo, os sistemas democráticos tendem a demonstrar superioridade persistente sobre as autocracias, em várias áreas. Isso ficou claro durante a pandemia, quando regimes autoritários – como a China – instituíram restrições draconianas, muitas vezes usando a violência para fazer com que suas populações seguissem a linha. Três anos depois, a China está atolada em uma complexa gestão da crise de Covid, enquanto os países democráticos a deixaram para trás. Os desenvolvimentos farmacêuticos foram mais impressionantes em países democráticos, enquanto as restrições pandêmicas – embora severas – foram mais humanas do que nas ditaduras.

A guerra na Ucrânia também é evidência da persistente superioridade militar das democracias. A entrega de armamento, treinamento e inteligência conseguiu parar o ataque russo. As democracias demonstraram um grau efetivo de coordenação econômica, humanitária e militar.

Esses traços de eficiência e vitalidade somam-se aos fundamentos inigualáveis ​​dos projetos democráticos, a começar pelo respeito às liberdades individuais e aos direitos humanos. Mas todos esses elementos positivos não são suficientes para garantir um futuro brilhante.

“As demandas sociais estão crescendo em velocidade exponencial. A capacidade de resposta não avançou no mesmo ritmo. É fundamental que as democracias apliquem seu mecanismo de autocorreção para reduzir a lacuna entre as demandas e a capacidade de resposta”, alerta Casas-Zamora, que defende que é necessária uma reformulação do contrato social.

Na União Europeia, a mudança da austeridade – após a crise financeira de 2008 – para a resposta anticíclica à pandemia parece muito com uma tentativa de um novo contrato social. “As políticas de austeridade são perigosas para a democracia. A Next Generation EU [plano de recuperação do bloco] está, sem dúvida, mais madura”, diz Gerbaudo.

O sociólogo observa que, de qualquer forma, as revoltas violentas – como aconteceu nos Estados Unidos há dois anos, ou no Brasil na semana passada – não devem ser menosprezadas.

“Esses [motins] não tiveram sucesso e têm características pitorescas. Mas o que eles significam não deve ser subestimado. Há um debate contínuo sobre se [os tumultos] são aventuras fascistas ou pós-fascistas. Na minha opinião, eles são uma reminiscência daqueles movimentos de nacionalismo autoritário pré-fascista do final do século 19 e início do século 20.” O que significa que, no futuro, eles poderão ser mais eficazes.

Jornal da Ciência

ENGLISH. EL PAÍS

quinta-feira, 20 de abril de 2023

LULA PRECISA FALAR MENOS NA QUESTÃO DA GUERRA ENTRE RÚSSIA E UCRÂNIA E AGIR MAIS. JÁ DIZIAM OS ANTIGOS: BOCA CALADA NÃO ENTRA MOSQUITO.


A GEOPOLÍTICA É UM MAR DE ARMADILHAS. E LULA PRECISA APRENDER ISSO. PRECISA OUVIR MAIS E FALAR MENOS. DEIXA A GEOPOLÍTICA QUE PARA QUEM ENTENDE. NUM MUNDO QUE ESTÁ EM PLENA GUERRA FRIA PELO CONTROLE DO COMÉRCIO MUNDIAL, DECLARAÇÕES EXPONTÂNEAS NÃO TEM LUGAR. CADA PALAVRA DEVE SER PENSADA E CALCULADA E SÓ PRONUNCIADA DEPOIS DE AVALIADA AS POSSÍVEIS E VARIADAS CONSEQUÊNCIAS. GEOPOLÍTICA NÃO É PARA AMADORES.


O presidente Lula aproveitou a visita do colega da Romênia, Klaus Werner Iohannis, na terça-feira 18 para modular o discurso a respeito da invasão da Ucrânia. O petista voltou a condenar a violação da integridade territorial do país pela Rússia, defendeu uma solução de paz “política e negociada” e rebateu as críticas de Washington, que acusou o brasileiro de “papaguear” a propaganda de Vladimir Putin. 

Antes tarde do que nunca. 

Ainda há tempo de reverter os estragos das declarações feitas na China e nos Emirados Árabes em um momento de “espontaneidade”, conforme a definição de um colaborador de Lula. Sob o petista, o País ainda tem crédito para gastar na geopolítica, prova o convite para o encontro, no Japão, do G-7, convescote das sete maiores economias.

O Brasil é uma nação independente, autônoma, e o presidente da República eleito pelo voto popular tem o direito de expressar opiniões sem se preocupar com as reações de Washington, Bruxelas, Pequim, Moscou ou da redação da GloboNews. Lula fez observações pertinentes a respeito da falta de empenho dos Estados Unidos e da União Europeia nas negociações de paz e insistiu no único caminho viável para resolver o conflito, a criação de um grupo de nações, espécie de G-20, sinceramente disposto a encontrar um termo entre as demandas da Rússia e da Ucrânia. 

O presidente caiu, no entanto, em uma armadilha. Deixou-se levar por um dos lados e minou o papel de mediador que pretende, ou pretendia, exercer. 

Recorro a José Sócrates, ex-primeiro-ministro de Portugal e colunista desta revista. O mundo, diz, divide-se atualmente em duas posições. Há quem defenda a paz sem condenar a Rússia e há quem condene a Rússia sem desejar a paz. 

Até a viagem à China, Lula trafegava com segurança por esse campo minado, mas pisou em um explosivo quando menos se esperava. Errou na forma e no tom. Os estragos estão feitos, mas há tempo de curar as feridas, tratamento iniciado com as declarações na presença do presidente romeno. 

Por falta de espaço, não vale a pena relembrar as motivações históricas e conjunturais para a invasão russa: de um lado, a “revolução” Maidan de 2014, patrocinada pelos Estados Unidos, que derrubou um governo ucraniano pró-Moscou, substituído por títeres ocidentais, o avanço da Otan rumo ao Leste, à revelia dos acordos assinados após a queda do Muro de Berlim, e as dúvidas sobre a extensão real do território da Ucrânia (a Crimeia foi um presente de Nikita Kruchev aos ucranianos em 1954). 

De outro, os delírios imperialistas e cafonas de Putin a respeito das glórias da Mãe Rússia. Para quem pretende, no entanto, conquistar a confiança das partes e ter sucesso no papel de articulador da paz, é um pecadilho (e Lula o cometeu) não condenar, sempre que possível, o fato de os russos terem violado tratados internacionais e conspurcado a integridade territorial de outro país, obrigado a se defender à custa de milhares de mortes, exílios forçados, destruição, fome e desespero. 

Eis um fato, tenha-se ou não simpatia pela Ucrânia ou por seu presidente-comediante. 

Mais: defensores incondicionais da paz precisam ser tão veementes agora quanto foram na condenação às invasões, baseadas em argumentos mentirosos, dos Estados Unidos no Iraque e no Afeganistão. Pau que dá em Little Francis, dá em Francishenko. 

O pior, no atual cenário, seria a desmoralização de todos os possíveis interlocutores. Desde a crise dos mísseis em meados do século passado, auge da Guerra Fria, o planeta não corria riscos reais de um conflito nuclear. Não só. Sem uma mediação confiável, a invasão da Ucrânia tende a se prolongar por tempo indefinido, assim como seus efeitos na economia mundial: inflação, estagnação, desabastecimento, violência. 

Quem comemora é a extrema-direita, que voltou a ganhar fôlego na Europa, continua com as garras afiadas na América Latina e sonha em voltar à Casa Branca. Nas suas ponderações, Lula não pode ser ingênuo a ponto de ignorar o risco, logo ele que propôs ao presidente dos EUA, Joe Biden, uma aliança mundial contra o extremismo fascistoide.

Fonte: Revista Carta Capital.

Texto Original de Sérgio Lírio.






terça-feira, 4 de abril de 2023

A ACADEMIA GRAPIÚNA DE ARTES E LETRAS, EM CONJUNTO COM A LOJA MAÇÔNICA 28 DE JULHO PROGRAMAM HOMENAGEM AO PASTOR E EDUCADOR APOLÔNIO BRITO


A Academia Grapiúna de Artes e Letras (Agral) promove, no dia 11 de abril, no período das 19h00min às 21h00min, em conjunto com a Loja Maçônica 28 de Julho, no salão de eventos daquela instituição, uma cerimônia especial de homenagem ao educador Apolônio Brito, que tem 108 anos de idade. Ele é o personagem principal do livro, romance biográfico, “Apolônio, o multiplicador”, de Samuel Mattos, publicado UESC/EDITUS, disponível para download gratuito no endereço http://www.uesc.br/editora/livrosdigitais2015/apolo_nio.pdf.

A reunião conjunta foi proposta pelo Venerável Mestre da Loja Maçônica 28 de Julho, José Alberto Campêllo Morais Bezerra, parceiro da Academia, para homenagear o pastor e professor, personagem do livro, com mais de cinco décadas de serviços prestados a Itabuna. O evento representa o reconhecimento ao seu trabalho no campo educacional e por sua atuação na comunidade.

O presidente da Agral, Samuel Mattos, explica que na mesma solenidade será realizada a posse do acadêmico Ari Melo Mariano, membro correspondente da Agral no Distrito Federal. Ele é professor doutor da Universidade de Brasília e autor de mais de 250 trabalhos acadêmicos e literários publicados em livros, revistas e em congressos nacionais e internacionais ao longo dos últimos 30 anos. Mariano também é autor de “O quanto caminhei” (poesias) e “O gigante que roubava livros”, um livro infantil, além de ter poemas publicados em várias antologias e em projetos na área digital.

Em função da homenagem a Apolônio e da posse de Ari Mariano, a palestra do acadêmico Jaime Nascimento, que é Médico e Historiador, foi transferida para a reunião mês de maio. Para o evento, a Agral vai convidar estudantes e professores da Rede Municipal de Educação de Itabuna, visto que o tema a Guerra de Canudos integra os conteúdos disciplinares do 9º ano agora em 2023 e seria, assim, uma contribuição da Academia aos estudantes e um passo para ampliar a sua integração junto aos diversos segmentos da sociedade grapiúna.

Texto: Blog do Thame

BLOG DO THAME